domingo, 11 de junho de 2017

O PODER E A VOLÚPIA DO PODER


Michel Temer, o presidente surreal

A melhor forma de entender o apego do peemedebista ao cargo é fazer um retrospecto de todos os esforços feitos para chegar à presidência

Por Fábio Terra, na CartaCapital

“Quem não quer ser lobo, não lhe vista a pele”, diz o adágio popular. Logo, quem quer ser, que a vista.

Michel Temer sabe disso muito bem. Assim, a melhor forma de entender a resistência do peemedebista em renunciar ao cargo de presidente é olhar para todos os esforços que ele fez para chegar ao cargo.
O primeiro sinal da vontade de Temer de ser presidente foi o lançamento, em outubro de 2015, do "Ponte para o Futuro", um programa de governo do PMDB que, naquela época, ainda fazia parte do governo Dilma Rousseff.

Pouco depois, ‘vazou’ uma carta em que ele chorava suas mágoas com a presidenta petista. Surrealmente, Temer se disse surpreso com a carta ter vindo a público enquanto que, surpresos, nos perguntávamos: se ele tinha medo do ‘vazamento’ da carta, por que não falou com Dilma pessoalmente? Não trabalhariam os dois no mesmo Palácio do Planalto? Não teria ele, o telefone dela? O Jaburu não fica ao lado do Alvorada?
Depois, o desejo de Temer pela presidência expressou-se pelo partido por ele presidido (e pelo qual ele foi eleito à vice-presidência) ter saído, em 29 de março de 2016, do governo para o qual foi eleito. Embora o PMDB deixasse, então, de ser governo, Temer permaneceu na vice-presidência do governo do qual saiu.
Obsessivo, em 7 de abril de 2016 - portanto, antes do julgamento do impeachment de Dilma na Câmara -, ocorreu um novo ‘vazamento’: um áudio de Temer dizendo à nação que se sentia preparado para ser presidente, mesmo ainda existindo uma presidente no cargo.
Em guerra com o governo com o qual foi eleito, mas do qual saiu, Temer pregava a pacificação e reunificação do país, querendo o cargo de presidente por meio de algo tão pacífico e unificador como um processo de impeachment.
Temer alcançou seu sonho interinamente em 12 de maio de 2016 e, em definitivo, em 31 de agosto de 2016, quando o Senado ratificou o impeachment de Dilma.
Porém, permaneceu o caráter surreal de tudo o que envolveu sua chegada ao cargo.
Em seus seis primeiros meses de governo (interino e definitivo, portanto) Temer perdeu seis ministros. Dos seus cinco assessores especiais, quatro não estão mais com ele e destes, dois estão presos. Claro, é impossível esquecer que ele é o primeiro presidente de nossa história a ser investigado pelo STF por conta do ‘encontro gravado’ entre o presidente e Joesley Batista, em maio de 2017. 

Sejamos todos surreais e finjamos que houve edições no áudio gravado por Joesley: ainda assim, o presidente não o ouviu dizendo que havia comprado juiz e procurador da república? Não percebeu que ele queria atrapalhar a Operação Lava Jato? Não o notou dizendo que pagava propina a Cunha? Achou mesmo que era uma ajuda à uma família despossuída? Como não sugeriu a Joesley ajudar os milhões de brasileiros que passam fome? Onde estariam os ouvidos, e o bom coração, de Temer?
A não correção dos erros no presente é a porta aberta para sua recorrência no futuro.
O que acontece no Brasil é surreal. Já o era com Dilma e assumiu contornos dramáticos com o nosso presidente surreal.
Embora saibamos que Temer quer se proteger com a prerrogativa do foro privilegiado, entremos na onda do governo surreal que nos lidera. Assim, perceberemos que, em seu surrealismo, Temer se coloca como um messias, que crê ser o obstinado portador da missão de, em suas próprias palavras, “colocar o Brasil nos trilhos”.
Uma dica bíblica cabe-nos, então: “Vigiai-vos dos falsos profetas que se chegam a vós em pele de ovelha, mas que por dentro são lobos vorazes”. (AQUI).
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[Fábio Terra é professor do Instituto de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal de Uberlândia]
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Atualização: depois de se colocar como um MESSIAS, "que crê ser o obstinado portador da missão de, em suas próprias palavras, 'colocar o Brasil nos trilhos'", o senhor Temer cunhou(!) - na verdade insistiu, já que antes, embora em outro contexto, se referira a ele - o epíteto definitivo ao declarar, após a conclusão do processo TSE, que doravante, mais tranquilo, iria enfim cuidar de pacificar o país: temos, então, o PACIFICADOR.  
Diz o articulista: "A não correção dos erros no presente é a porta aberta para sua recorrência no futuro." De fato. Basta ver a mais recente 'proeza' do senhor Temer: teria mandado que o serviço de inteligência devassasse (que palavra!) a vida do ministro Luiz Edson Fachin, do STF, relator das ações da Lava Jato, em busca de eventuais desvios. 

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