sexta-feira, 14 de outubro de 2016

O BOLETIM-GUIA DO BACEN


A lógica cruel do Boletim Focus

Por André Araújo

O Banco Central do Brasil é, em larga medida, guiado por um questionário enviado aos economistas de mercado que sabem que suas respostas irão influenciar quem pergunta, o próprio Banco Central.
São 120 os respondentes, na esmagadora maioria instituições financeiras, porque se exige aos participantes que tenham equipes próprias de projeções macroeconômicas, coisa que normalmente só bancos têm.

Com isso quase não há participação da economia produtiva no Boletim desde sua criação. e seu principal alvo é dar cobertura "técnica" à política de juros altos demandados pelo mercado financeiro, com ou sem inflação, com ou sem recessão.

O Boletim existe a partir da implantação do modelo de metas de inflação em 1999 e funciona como alimentador desse modelo, justificando metas e, por conseguinte, política de juros. Portanto, NÃO É UM QUESTIONÁRIO NEUTRO, suas respostas tornam a profecia autorrealizável: se eu respondo que a taxa de juros deve subir, estou ajudando a fazê-la subir através de minha resposta e isto me beneficia, já que o Banco Central toma meu palpite como indicação, o que na realidade passa a ser também um desejo do respondente.

Ora, o Banco Central é a AUTORIDADE MONETÁRIA, o poder que controla a moeda no País, essa autoridade deve LIDERAR E NÃO SER LIDERADA pelo mercado.

Alan Greenspan, lendário Chairman do Fed, costumava telefonar todo dia a fabricantes de telhados, de sapatos, de geladeiras, para saber como iam as vendas. Preocupava-se com a economia produtiva e tinha a sensibilidade da economia real. Não telefonava para executivos de bancos, não tinha muito a obter deles porque o Fed já tinha todas as informações diárias dos bancos, como o BC também tem; então por que perguntar o que eles acham da economia?

Quando todo o mercado mundial fica na expectativa respeitosa de saber o que o Federal Reserve vai fazer com os juros, é porque o Fed NÃO pergunta ao mercado, ele decide e pronto, o mercado que se adapte à linha de política econômica que o FED entende correta.

No Brasil fazemos o contrário: o BC é que se ajusta ao que o mercado quer através do Boletim FOCUS, uma espécie de projeção do que o mercado vê como a melhor no cenário.

O Banco Central, como o poder sobre a moeda que é, deveria ter vergonha de se atrelar a esse boletim, que nem deveria existir. Que o Departamento de Economia do BC pesquise e obtenha dados e projeções sobre a economia para ter informações como base de suas decisões, o que não pode é ele mesmo ser o perguntador e o guiado pelas respostas, avalizando com seu logotipo a direção que o mercado quer dar para a economia.

Publicado toda segunda-feira, o Boletim Focus guia a economia para onde o mercado aponta, não há rendição tão humilhante em um País que se dá ao respeito. É pelo Boletim FOCUS que o mercado manda na mídia econômica e ao fim manda nas decisões do Banco Central.

Dizem seus criadores que o FOCUS é necessário para o modelo de metas de inflação. Pior ainda; uma bobagem ajudando uma besteira e os dois afundando a economia. O Governo deveria mandar o BC acabar com esse instrumento de flagelação da economia e de desmoralização do Banco Central.

O FOCUS virou uma espécie de ultimato que o mercado dá ao Banco Central: "Faça como projetamos porque é o que nós queremos". (Fonte: aqui).

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Em resumo: Nos EUA, metrópole do liberalismo, o Fed consulta(va) fabricantes de telhados, de sapatos, de geladeiras, entes que realizam vendas; no Brasil, o Bacen consulta financeiras, agências, bancos e demais rentistas, que auferem ganhos monumentais com títulos públicos orientados pela Selic, bem como encargos financeiros advindos de operações de crédito e serviços.

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