quarta-feira, 1 de julho de 2015

O PROCESSO QUE CONDUZ À CRISE DA GRÉCIA


A crise da Grécia e as armas do capital

Por Luis Nassif

O cerco imposto à Grécia tem antecedentes desde que o mundo conheceu a maior máquina de globalização da história: a do capital financeiro.

Esse processo se inicia ainda no século 19, sob a batuta do Banco da Inglaterra e o sistema de conversão em ouro. Um país só poderia emitir moeda se lastreada em ouro depositado em seu banco central.

Cada vez que a Inglaterra sofria algum problema de liquidez, bastava um leve aumento nas taxas da Libor para atrair ouro de outros países, obrigando os respectivos governos a enxugar a liquidez.

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De certo modo, o ponto central de distinção entre desenvolvidos e emergentes estava na maior ou menor vulnerabilidade externa.

Desde o início, um dos grandes mercados do capital financeiro foram os empréstimos a governos. E, quando os empréstimos não eram honradas, o calote justificaria até a invasão do país devedor pelo credor, conforme decisão da Corte Internacional de Haia, referendada pelo representante brasileiro, Ruy Barbosa.

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A vulnerabilidade externa sempre foi um dos grandes fatores de debilidade da economia brasileira. Ao longo da história, o país renegociou várias vezes as dívidas.

Ao longo do século, sempre houve um conflito entre prioridades nacionais e as prioridades do capital financeiro. Para este interessa o livre trânsito e a previsibilidade. Por tal, entenda-se políticas cambiais previsíveis. As grandes oscilações cambiais são aproveitadas pelos mais espertos, mas não pelo todo.

Para as nações, projetos de desenvolvimento jamais prescindiram de moedas competitivas (desvalorizadas) nas fases iniciais de desenvolvimento. É o que assegura a condição de competir, via preços, com os produtos tecnologicamente mais avançados dos países centrais.

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Ao longo de toda história econômica do século, vigoraram as tentativas de impedir a autonomia da política cambial. Em parte da história – especialmente no século 19 – através da conversibilidade do ouro.

No pós guerra, através do acordo de Bretton Woods, definindo paridades cambiais a serem obedecidas pelas nações, o Brasil entrou de pé esquerdo no acordo porque entre a definição das paridades e o início da sua implementação houve uma inflação interna que apreciou (ou seja, provocou o aumento do valor em relação a outas moedas, como o dólar - nota deste blog) a moeda brasileira.

A cada soluço de crescimento, com Vargas, JK, Jango, Figueiredo, Sarney, FHC havia uma crise nas contas externas interrompendo a caminhada.

Depois, com a União Europeia, os países membros abdicaram da sua própria moeda.

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Hoje em dia, quando um país devedor quebra, sem dispor da alternativa de promover políticas cambiais competitivas, não é necessário a diplomacia das canhoneiras.

Basta uma agência de risco rebaixar a nota e cortar-se o fluxo de oxigênio. Antes disso, os capitais locais fogem do país sem encontrar obstáculos pela frente. Nos últimos dias, 4 bilhões de euros deixaram a Grécia. E a dívida renegociada é de 2 bilhões de euros.

Nos próximos dias, será um Zeus nos salve. E se constatará que avanços imensuráveis do setor financeiro, criação de ferramentas sofisticadíssimas, união de algumas das maiores economias mundiais... Tudo isso foi insuficiente para salvar um pequeno país, berço da civilização ocidental.
Salvou apenas os capitais que afundaram a Grécia. (Fonte: aqui).

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A crise não é só da Grécia, é da Grécia e da União Europeia/FMI/BCE: se a Grécia não se salvar, significará que a austeridade não só arrebenta as condições do povo como não consegue que os países compelidos a optar por ela quitem normalmente seus empréstimos externos; se a Grécia se salvar, é porque terá conseguido um acordo menos traumático do que o até aqui imposto pela UE, o que estimulará outros países, como Portugal, a também seguirem no futuro a postura adotada por ela, de resistir até depois da hora fatal, enfraquecendo a 'aliança'. 

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