terça-feira, 27 de janeiro de 2015

SOBRE DELAÇÃO PREMIADA, MEIAS INFORMAÇÕES E VACILOS DIVERSOS


Modos de dizer

Por Jânio de Freitas

Procuradores e juízes que negociam delações podem ceder direitos financeiros da União e da Petrobras?

A delação premiada é, por si mesma, de discutível e discutida moralidade, não precisa de acréscimos factuais que a façam ainda mais questionável. A autodenominada "força-tarefa Lava Jato" traz, porém, outro adendo aos motivos de críticas à delação premiada e seus efeitos não judiciais, como os vazamentos e as duvidosas acusações que escapam do "segredo de Justiça", as pressões apontadas por advogados, e outros.

O acréscimo se encontra em uma nota da "força-tarefa" com a intenção de negar que o "doleiro [Alberto Youssef] pode ganhar R$ 10 milhões se ajudar a recuperar R$ 500 milhões desviados da Petrobras", notícia assinada na Folha por Mario Cesar Carvalho e Gabriela Terenzi, com base em informações do advogado Antonio Figueiredo Basto, defensor de Youssef.

A nota é taxativa: "Não existe qualquer cláusula de pagamento pela União de recompensa para o acusado". E critica os repórteres por não lerem ou não terem entendido o acordo da delação premiada. Mas, por pouco interesse em bem informar ou com propósito não explicitado, deixa de incluir, em seus "esclarecimentos a omissões significativas nas reportagens", a informação decisiva.

Essa informação está em entrevista do procurador Carlos Fernando dos Santos Lima para negar a existência da "cláusula de recompensa" referida por Figueiredo Basto. No texto do "Globo": em lugar de recompensa, "segundo o procurador, o acordo de delação premiada prevê o abatimento do valor da multa que ele [Alberto Youssef] terá que pagar no fim do processo, ainda a ser definida". Segue-se a explicação pormenorizada, pelo procurador, dos critérios de aplicação e abatimento da multa.

Carlos Fernando dos Santos Lima é integrante da Lava Jato e praticante daquela linha-duríssima que se confunde, frequentemente, com arbitrariedade (hábito comum, quase característica, em procuradores da República). Não considera que haja recompensa a Youssef. Mas o que diz e a nota escamoteia é só um outro modo de dizer o essencial da notícia contestada: os valores de multa devida pelo delator premiado serão propriedade da União, e qualquer parte que lhes seja retirada para pagamento a Youssef, ou a outros, consistirá em remuneração com dinheiro da União.

Restam duas questões. Os procuradores e juízes que negociam delações premiadas podem ceder direitos financeiros da União (multas) e da Petrobras (devoluções)? Não é tempo de acabar com meias informações e liberar notas e documentos que proporcionem ao país clareza sobre os métodos e o teor das negociações entre Ministério Público e Judiciário, de um lado, e acusados, de outro?

Já que o tema é retribuição, em agradecimento à força-tarefa pelo ensinamento de jornalismo com que encerra sua nota, vai uma sugestão para notas futuras: em vez de "sem prejuízo do perdimento de bens e valores", pode escrever "sem prejuízo da perda" que a Língua Portuguesa agradecerá.

A MUDANÇA
Em sua participação final no Fórum de Davos, Joaquim Levy disse, sobre a nova política econômica, que "nós decidimos mudar". A imprecisão deliberada desse plural não disfarça a inverdade, caso expresse o país, como interpretado por parte do noticiário, nem a presunção do autor, se referida à decisão governamental.

O país não decidiu mudar. A maioria do eleitorado não apenas votou pela continuidade: rejeitou a política econômica proposta por Aécio e agora adotada por Dilma.

Quem decidiu mudar foi Dilma Rousseff, e decidiu sozinha, em uma extravagância de poder contra a vontade das urnas. Espera-se que não volte a falar em plebiscito ou em qualquer consulta à vontade pública. (Fontes: aqui e aqui).

................
Diante de certa 'nebulosidade' relativamente à questão judicial, transcrevo interessante comentário pinçado entre os expostos no Jornal GGN:

"O que a justiça brasileira precisa entender, mas entender mesmo, é que a lei depende muito de quem a emprega. O juiz precisa ter certeza disso, senão ele pensa que é dono da lei ou que a lei lhe impõe procedimento. Pensa, mas não é assim. E ser juiz onde há um pig, uníssono, é uma tarefa dificílima. Será que não estou sendo levado, será??? Ser juiz é, em si, muito difícil.

Outra coisa: delação premiada é perigosíssima. Se não sabem disso, é melhor não usá-la. É remédio que, se a dosagem e controle não forem perfeitos, mata o doente. Vazamento, principalmente seletivo, é desastroso. Uso político, terrível, é transformá-la em outro crime. Ambos dificílimos de serem evitados. Ingenuidade perante o "meio" (pode ser mídia) é destruidor. Transformá-la em poder, então, é uma coisa a ser evitada a cada singelo passo, perigosíssimo, comprometedor. Por isso deu certo contra a máfia italiana.

A justiça está precisando, e muito, de levar em conta o dito árabe, lá dos tempos do Malba Tahan: 'Quem não desconfia de si próprio não merece a confiança dos outros'". (H. C. Coelho).

Nenhum comentário: