segunda-feira, 22 de abril de 2013

ECOS DO ATENTADO


Imagens

Por Luis Fernando Veríssimo

Na investigação desse atentado em Boston a polícia e o FBI têm à sua disposição as imagens de dezenas de câmeras de circuito fechado dispostas em postes, frentes de lojas e portarias de edifícios ao longo do percurso da maratona. E contarão com as imagens gravadas nos celulares e câmeras portáteis de participantes e assistentes da maratona, num número incalculável.

Talvez esta mega cobertura não ajude em nada, mas o fato é que vivemos na era do registro universal, em que, pelo menos em tese, nenhum movimento do cidadão de uma cidade moderna deixa de ser captado ou — se for um criminoso — flagrado.

Cheguei a imaginar como seria um filme que contasse a vida de algum representante da nossa espécie e da nossa época apenas através de registros selecionados, do tape do seu parto, gravado pelo pai, através de todos os superoitos da sua infância e juventude, até a gravação da sua posse como ministro ou do seu assalto a uma mercearia abanando para a câmera, a escolher.

Também se pode especular como teria sido a história do mundo se detalhes dos seus grandes momentos ou de suas passagens mais terríveis tivessem o escrutínio eletrônico de hoje. Na ausência da câmera onipresente os acontecimentos eram conhecidos por testemunhos pouco confiáveis, que transformavam banalidades em feitos heroicos e barbaridades em mitos.

Hoje se sabe que o repúdio do público americano à guerra no Vietnã cresceu porque aquela foi a primeira guerra com cobertura instantânea da História, a primeira que não foi mostrada em filmes desatualizados, mas gravada e despejada diariamente pela TV no tapete da sala. E não é preciso ir muito longe. Imagine se na tropa que acompanhava dom Pedro I às margens do Ipiranga houvesse uns quatro ou cinco celulares gravando tudo.

A cena da proclamação da nossa independência certamente não seria tão retumbante. A cena retratada na pintura famosa é mais bonita, mas é falsa. Ou — para quem acha que entre o fato e a lenda deve-se sempre publicar a lenda — é falsa, mas é mais bonita.

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