quarta-feira, 4 de maio de 2011

SAL É BOM E NÃO FAZ MAL?


Estudo provoca polêmica ao revelar que dieta com baixo teor de sal é inefetiva

Por Gina Kolata

Um novo estudo revelou que as dietas com baixo teor de sal aumentam o risco de morte provocada por ataques cardíacos e derrames e não previne a hipertensão arterial, mas as limitações da pesquisa significam que o debate sobre os efeitos do sal na dieta estão longe de terminar.

De fato, especialistas do Centro para a Prevenção e o Controle de Doenças dos Estados Unidos tiveram uma impressão tão forte de que o estudo continha falhas que eles o criticaram em uma entrevista, algo que esses profissionais normalmente não fazem.

Peter Briss, um médico da instituição, disse que o estudo teve dimensão muito pequena; que as pessoas estudadas eram relativamente novas, com uma média de 40 anos de idade no início do projeto; e que com poucas anomalias cardiovasculares, é difícil chegar a conclusões. E, de acordo com Briss e outros especialistas, o estudo vai de encontro às evidências que indicam que o alto consumo de sódio pode aumentar o risco de doenças cardiovasculares.

“Neste momento, é preciso encarar esse estudo com ceticismo”, advertiu Briss.

O estudo foi publicado na edição de (hoje) 4 de maio do periódico “Journal of the American Medical Association”. O projeto, que só envolveu no início indivíduos que não sofriam de hipertensão arterial, teve um caráter observacional, e foi considerado, na melhor das hipóteses, sugestivo, e não conclusivo. Ele incluiu 3.681 indivíduos europeus de meia idade que não sofriam de hipertensão arterial nem de doenças cardiovasculares. Os indivíduos tiveram a saúde acompanhada por um período médio de 7,9 anos.

Os pesquisadores avaliaram o consumo de sódio dos participantes no início do estudo e ao final mediram a quantidade de sódio excretada na urina deles durante um período de 24 horas. Todo sódio consumido é excretado na urina em um período de um dia, de forma que esse método se constitui na forma mais precisa de determinar o consumo desse elemento.

Os pesquisadores descobriram que quanto menos sal as pessoas ingerem, mais probabilidade elas têm de morrer de doenças do coração – 50 pessoas que faziam parte do grupo de um terço da amostragem total que consumia menos sal (2,5 gramas de sódio por dia) morreram durante o estudo, 24 morreram no grupo de consumo intermediário (3,9 gramas de sódio por dia) e dez no grupo de alto consumo de sal (6 grama de sódio por dia). E embora aqueles que ingeriam mais sal tivessem apresentado, em média, uma ligeira elevação da pressão sistólica – um aumento de 1,71 milímetros na pressão para cada aumento de 2,5 gramas de sal ingerido diariamente –, eles não apresentaram uma maior propensão a desenvolver a hipertensão arterial.

“Se o objetivo é prevenir a hipertensão arterial com um menor consumo de sódio, o estudo revela que isso não funciona”, afirmou o principal autor do estudo, o médico Jan A. Staessen, professor de medicina da Universidade de Leuven, na Bélgica.

Mas Briss afirma que dentre os outros problemas apresentados pelo estudo está o fato de que aqueles indivíduos que pareciam consumir a menor quantidade de sal forneceram menos urina do que os que consumiram mais, o que seria uma indicação de que eles podem não ter coletado toda a sua urina em um período de 24 horas.

O médico Frank Sacks, da Escola de Saúde Pública da Universidade Harvard concorda e também diz que o estudo apresenta falhas.

“Esse é um estudo problemático”, critica Sacks. “Nós não devemos orientar nenhum tipo de decisão na área de saúde pública com base nele”.

Michael Alderman, um pesquisador da pressão arterial da Faculdade de Medicina Albert Einstein e editor do periódico “American Journal of Hypertension”, diz que a literatura médica sobre o sal e os seus efeitos sobre a saúde é inconsistente. Porém, ele afirma que o novo estudo não é o único a descobrir efeitos adversos das dietas com baixo teor de sódio. O seu próprio estudo, com pessoas que apresentavam hipertensão arterial, revelou que aqueles que ingerem menos sal são os que têm maior probabilidade de morrer.

Alderman diz que no passado já atuou como consultor não remunerado do Instituto do Sal, mas que atualmente não faz consultoria para a instituição e nem para a indústria de alimentos, e tampouco recebe qualquer apoio ou dinheiro dos grupos que integram essa indústria.

Alderman afirma que a redução do consumo de sal traz consequências que vão além da pressão arterial. Isso faz também, por exemplo, com que aumente a resistência à insulina, o que pode gerar o risco de doenças do coração.

“Dieta é uma coisa complicada”, alerta Alderman. “Sempre haverá consequências imprevistas”.

Segundo Alderman, um dos problemas com os debates sobre o sal é que todos os estudos sobre isso são inadequados. Ou eles consistem de estudos baseados em intervenções de curto prazo nas quais os indivíduos ingerem grandes quantidades de sal e depois são privados dessa substância para que se possa avaliar os efeitos disso sobre a pressão sanguínea, ou eles têm o formato de pesquisas, como esta, que observam determinadas populações e avaliam se aqueles indivíduos que consumem menos sal são mais saudáveis.

“Estudos observacionais nos dizem o que um indivíduo vai experimentar se ele selecionar uma determinada dieta”, explica Alderman. “Mas eles não nos dizem o que acontecerá se modificarmos o consumo de sódio das pessoas”.

Alderman diz que o que se faz necessário é um estudo de grandes dimensões no qual os indivíduos participantes sejam escolhidos aleatoriamente para seguirem ou não uma dieta de baixo teor de sódio, e que esses indivíduos sejam acompanhados durantes anos para determinar se a ingestão de menos sal melhora a saúde e reduz o índice de mortes provocadas por doenças cardiovasculares.

Mas outros especialistas dizem que tal estudo jamais será feito.

“Esta é uma daquelas situações realmente interessantes”, diz o médico Lawrence Apple, professor de medicina, epidemiologia e saúde internacional das Instituições Médicas Johns Hopkins. “Podemos dizer, 'Tudo bem, deixemos de lado os estudos observacionais porque eles apresentam todos esses problemas'”. Mas, segundo ele, apesar da virtudes dos testes clínicos aleatórios controlados, um estudo desse tipo “mais será realizado”. Seria impossível manter pessoas em uma dieta de baixo teor de sódio em um mundo no qual tanto sódio é acrescentado aos alimentos preparados.

Briss acrescenta que não seria prudente tomar ações na área de saúde pública enquanto os pesquisadores aguardassem por um teste clínico que poderia se revelar até mesmo inviável.

Mas Alderman discorda.

“Os defensores das dietas de baixo teor de sal sugerem que todos os 300 milhões de norte-americanos sejam submetidos a tal dieta. Mas se esses indivíduos são incapazes de fazer com que as pessoas sigam uma dieta de baixo teor de sal para a realização de um teste clínico, eu me pergunto: sobre o que eles estão falando?”.

E ele acrescenta: “Isso custará dinheiro, mas é por isso que nós fazemos ciência. Também custará dinheiro modificar a composição dos alimentos”. (Fonte: UOL).

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Depois de quarenta anos como vilões, o café e o ovo foram 'liberados'; agora chegou a vez do sal. O fato de os coordenaores da pesquisa a condenarem não se sustenta: se se tratasse efetivamente de um embuste, eles mesmos cuidariam de abortar sua divulgação. Vai ver, a condenação é 'defesa prévia' destinada a salvaguardar os doutos pesquisadores.

Mas convém lembrar o velho alerta: tudo o que é demais é demasiado.

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